Muitos dizem que o Deus do Antigo Testamento foi sanguinário
e irado. Atribuem a Deus uma espécie de esquizofrenia ao tentarem contrapor o
Deus do Novo Testamento com o do Antigo. Como se houvesse uma alteração em Sua
personalidade, de repente, o Deus sanguinário se tornou o Deus misericordioso.
Não! Deus não muda. Ele é perfeito desde toda eternidade. É o mesmo Deus que se
apresenta, ora com sua face irada e ciumenta, ora com sua face misericordiosa e
salvífica. O que inicialmente pode parecer contraditório está em perfeita
sintonia com toda a história da salvação. A verdade é que SIM, Deus castiga. E
o faz, não porque seja um Deus mau, pelo contrário, é justamente por ser um
Deus de amor que corrige os seus filhos. A questão a ser entendida é em que
consiste a correção divina.
O grande doutor da Igreja, Santo Tomás de Aquino, em sua
famosa obra Suma Teológica, ao falar sobre a vingança explica o que significa o
castigo divino. Para ele, a vingança tem uma conotação diversa daquela que é
compreendida atualmente, enquanto, na linguagem moderna vingança representa um
ato de fúria contra alguém que nos faça o mal, para Santo Tomás, adaptando para
a nossa linguagem, trata-se de um castigo infligido para a conversão de um
pecador.
Sabemos que Deus ama o homem e quer salvá-lo (conf. Jo
3,16), assim, como um pai amoroso, permite o sofrimento para que o filho se
volte para Ele, pois nisto consiste a salvação. São inúmeros os casos de
conversão ocorridas após um grande sofrimento, perda ou doença. É verdade
também que Deus procura atrair o homem com vínculos humanos de amor, mas nem
sempre funciona, nem sempre a linguagem do carinho é entendida e, nesses casos,
é preciso que o reto caminho seja ensinado por meio da disciplina.
Santo Tomás afirma que Deus administra a questão do
sofrimento da humanidade quase da mesma forma que o homem administra um sistema
penal, ou seja, penalizando as pessoas primeiro para que se convertam e segundo
para evitar dificuldades na sociedade. Para ele, o que justifica o castigo é a
intenção.
"A vingança se consuma quando se inflige ao pecador um
mal de pena. Por conseguinte, na vingança deve-se levar em conta o ânimo
daquele que a exerce. Porque se a intenção dele recai principalmente sobre o
mal daquele de quem se está vingando, e nisto se compraz, então isto é
absolutamente ilícito, porque o fato de se comprazer com o mal de outrem é da
ordem do ódio, que repugna à caridade, pela qual devemos amar todos os homens.
E ninguém se desculpa alegando querer o mal daquele que injustamente lhe fez
mal; da mesma forma que ninguém se desculpa de odiar aqueles que o odeiam."
(Suma Teológica II-II, q. 108, a. 1)
Portanto, é lícito castigar desde que a intenção seja para
salvar o transgressor, para corrigir o transviado e converter o pecador,
mas nunca motivado pelo ódio irracional
que deseja a destruição e a morte.
No caso das correções divinas, porque Deus é Sumo Bem,
sabemos que tudo o que Ele faz concorre para o bem de seus filhos. É necessário
enxergar nas desventuras da própria vida o cuidado e o amor de Deus, enxergar
que a Sua misericórdia muitas vezes se manifesta em forma de correção. Isso
ocorre por motivos simples, mas contundentes: Ele ama seus filhos e quer o bem
e a salvação de todos.
https://padrepauloricardo.org
Nenhum comentário:
Postar um comentário