Deus, em sua infinita onipotência, não poderia ter criado um mundo
sem males, sem o Mal? A resposta é positiva. Sim, Ele poderia ter criado um mundo no qual todos os
homens O amassem e Lhe fossem fiéis. Bastaria ter revelado Sua face. Por que
não o fez? O Catecismo da Igreja Católica, em seus números 310 e 311, diz que:
Deus sempre poderia criar algo
melhor. Todavia, em sua sabedoria e bondade infinitas, Deus quis livremente criar
um mundo em estado de caminhada para sua perfeição última.
Os anjos e os homens, criaturas
inteligentes e livres, devem caminhar para seu destino último por opção livre e
amor preferencial. Podem, no entanto, desviar-se. E, de fato, pecaram. Foi
assim que o mal moral entrou no mundo, incomensuravelmente mais grave do que o
mal físico. Deus não é de modo algum, nem direta nem indiretamente, a causa do
mal moral. Todavia, permite-o, respeitando a liberdade de sua criatura e,
misteriosamente, sabe auferir dele o bem. (CIC 310-311)
Portanto, a resposta para a pergunta: por
que alguns nascem pagãos ou ateus? passa, necessariamente pela
questão da liberdade do homem. Do desejo de Deus em que o homem O ame
livremente.
Deus
é uma verdade tal, que no momento em que o homem o vir face a face não terá
como resistir, será irremediavelmente atraído para o Seu amor. Se isso
acontecesse, o homem perderia a liberdade. O Catecismo segue ensinando:
Deus criou o homem dotado de razão
e lhe conferiu a dignidade de uma pessoa agraciada com a iniciativa e o domínio
de seus atos. ‘Deus deixou o homem nas mãos de sua própria decisão’ (Eclo
15,14), para que pudesse ele mesmo procurar seu Criador e, aderindo livremente
a Ele, chegar a plena e feliz perfeição.” (CIC 1730)
A liberdade é o poder, baseado na
razão e na vontade, de agir ou não agir, de fazer isto ou aquilo, portanto, de
praticar atos deliberados. Pelo livre-arbítrio, cada qual dispõe sobre si
mesmo. A liberdade é, no homem, uma força de crescimento e amadurecimento na verdade
e na bondade. A liberdade alcança sua perfeição quando está ordenada para Deus,
nossa bem-aventurança. (1731)
Assim, o ser humano é livre para estar em Deus ou não. E isto foi
querido por Ele, sendo mais uma demonstração de seu imenso amor pela humanidade.
Contudo, engana-se quem pensa que o não-crer é um estado natural. Pelo
contrário, o estado natural do homem é crer, é buscar o sentido de sua vida no
Bem Maior. Essa busca é o que molda a trajetória do homem na terra. Santo
Agostinho, em sua obra “Confissões”,
profere uma frase célebre a esse respeito:
Grande és tu, Senhor, e sumamente
louvável: grande a tua força, e a tua sabedoria não tem limite. E quer
louvar-te o homem, esta parcela de tua criação; o homem carregado de sua
condição mortal, carregado com o testemunha de seu pecado e com o testemunho de
que resistes aos soberbos; e, mesmo assim, quer louvar-te o homem, esta parcela
de tua criação. Tu o
incitas para sinta prazer em louvar-te; fizeste-nos para ti, e inquieto está o
nosso coração, enquanto não repousa em ti.
O ateísmo não é a condição natural do homem. Para ser ateu e
manter-se assim, é necessário um esforço, pois essa postura é anti-natural. “O desejo de Deus está inscrito no coração do homem, já que o homem
é criado por Deus e para Deus; e Deus não cessa de atrair o homem para si, e
somente em Deus o homem há de encontrar a verdade e a felicidade que não cessa
de procurar”, sabiamente ensina o Catecismo em seu nº 27. Porém, um pouco
mais à frente, ele nos diz que a tão almejada união íntima e vital com Deus “pode ser esquecida, ignorada ou até rejeitada explicitamente pelo
homem”, que realmente é capaz disso ao fazer a opção pelo ateísmo. O
Catecismo fala claramente sobre esse tipo de rejeição ao amor de Deus. Eis:
Muitos de nossos contemporâneos não
percebem de modo algum esta união íntima e vital com Deus, ou explicitamente a
rejeitam, a ponto de o ateísmo figurar entre os mais graves problemas do nosso
tempo.
O
termo ‘ateísmo’ abrange fenômenos muito diversos. Uma forma frequente é o
materialismo prático, de quem limita suas necessidades e suas ambições ao
espaço e ao tempo. O humanismo ateu considera falsamente que o homem é o seu
própro fim e o único artífice e demiurgo de sua própria história. Outra forma
de ateísmo contemporâneo espera a libertação do homem pela via econômica e
social, sendo que a religião por sua própria natureza, impediria esta
libertação, na medida em que, ao estimular a esperança do homem numa quimérica
vida futura, o desciaria da construção da cidade terrestre.
Na
medida em que rejeita ou recusa a existência de Deus, o ateísmo é um pecado
contra a virtude da religião. A Imputabilidade desta falta pode ser seriamente
diminuída em virtude das intenções e das circunstâncias. Na gênese e difusão do
ateísmo, grande parcela da responsabilidade pode caber aos crentes, na medida
em que negligenciando a doutrina da fé, ou por uma exposição enganosa da
doutrina, ou por deficiência em sua vida religiosa, moral e social, se poderia
dizer deles que mais escondem do que manifestam o rosto autêntico de Deus e da
religião.
Muitas
vezes o ateísmo se funda em uma concepção falsa da autonomia humana, que chega
a recusar toda dependência em relação a Deus. Contudo, o reconhecimento de Deus
não se opõe de modo algum à dignidade do homem, já que esta dignidade se
fundamenta e se aperfeiçoa no próprio Deus. A Igreja sabe perfeitamente que sua
mensagem se coaduna com as aspirações mais íntimas do coração humano. (CIC
2123-2126)
Infelizmente,
o ateísmo não é o maior dos males modernos. O neo-paganismo se mostra ainda
mais nefasto, pois, logo o ateísmo é abraçado, abre caminho para que, no lugar
de Deus, outros deuses sejam colocados (dinheiro, sexo, poder, juventude etc).
O neo-paganismo, pelo que se vê, leva à idolatria definida como “uma perversão ao sentimento religioso inato do homem”. E
o idólatra é, portanto, aquele que refere a qualquer coisa que não seja Deus a
sua indestrutível noção de Deus. (2144)
Assim, com base nas palavras do Catecismo: “Alegre-se o coração dos que buscam o Senhor".
Se o homem pode esquecer ou rejeitar a Deus, este de sua parte, não cessa de
chamar todo homem a procurá-lo, para que viva e encontre a felicidade. Mas esta
busca exige do homem todo o esforço de sua inteligência, a retidão de sua
vontade, um coração reto e também o testemunho de outros, que o ensinam a
procurar a Deus.” (30), peçamos a graça de valorizarmos sempre mais a liberdade
concedida por Deus, amando-O livremente e intensamente nessa vida, para que, ao
seu término, possamos contemplar-Lhe face a face e para todo o sempre.
Fonte: https://padrepauloricardo.org
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