As Bem-Aventuranças são o Caminho para o Céu
O sermão se inicia com as Nove Bem-Aventuranças, que
completam os Dez Mandamentos do Antigo Testamento entregues a Moisés no Monte
Sinai. Os Mandamentos do Antigo Testamento determinam o que é proibido fazer e
dão um tom de severidade. Os Mandamentos do Novo Testamento, entretanto,
apontam o que é necessário ser feito e são impregnados de amor. Os antigos Dez
Mandamentos foram escritos em tábuas de pedra e assimilados por meio de
estudos. Ao contrario destes, os mandamentos do Novo Testamento foram escritos
pelo Espírito Santo nas tábuas do coração dos que acreditam. Aqui está o texto
destes perenes mandamentos:
"Vendo Jesus as multidões, subiu ao monte, e como se
assentasse, aproximaram-se os seus discípulos; e Ele passou a ensiná-los,
dizendo: Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos
céus. Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados. Bem-aventurados
os mansos, porque herdarão a terra. Bem-aventurados os que têm fome e sede de
justiça, porque serão saciados. Bem-aventurados os misericordiosos, porque
alcançarão misericórdia. Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a
Deus. Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus.
Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos
céus. Bem-aventurados sois quando, por minha causa, vos insultarem e vos
perseguirem e, mentindo, disserem todo mal contra vós por causa de
mim.Alegrai-vos e exultai, porque é grande a vossa recompensa nos céus; pois
assim perseguiram aos profetas que existiram antes de vós" (Mateus
5:1-12).
O fato extraordinário sobre as Bem-aventuranças é que cada
uma delas começa com a palavra Bem-aventurados. Os mandamentos do Antigo
Testamento agem com proibição de certas coisas e ameaçam com castigo enquanto
que as Bem-aventuranças encorajam com o bem, convidam à mais alta e infinita
alegria junto a Deus.
Desde o tempo que sucumbiu ao pecado de nossos ancestrais,
as pessoas perderam a noção da verdadeira felicidade e até a correta noção do
que ela é. O verdadeiro sentido da palavra "felicidade" começa a soar
como um sonho inacessível ou ideal inatingível. Porém, Nosso Senhor Jesus
Cristo oferece-nos a felicidade, numa realidade específica e acessível. E essa
promessa aplica-se não somente à vida futura nos Céus, mas nesta realidade aqui
mesmo, quando a pessoa se liberta do fardo do pecado, ganha paz em sua
consciência e torna-se capaz de receber a graça do Espírito Santo. É o Espírito
Santo que nos dá essa inexplicável alegria que não pode ser comparada com
nenhum prazer terreno. Ao lermos sobre as vidas de santos nós percebemos que os
autênticos cristãos, no esforço de preservar e fortificar a graça de Deus em
suas vidas estavam prontos para sacrificar-se em qualquer situação.
Ao adentrarmos no sentido profundo do significado das
Bem-aventuranças, torna-se evidente que elas se formam em determinada
seqüência. Elas mostram o caminho da real felicidade e explicam como seguir
este caminho. Elas podem ser comparadas a uma escada celeste ou a uma uma
sólida edificação das virtudes.
O ponto inicial das Bem-aventuranças é o fato de que
qualquer pessoa sem exceção é atormentada pelo pecado e como resultado, fica
sentindo-se desamparada e miserável. A tragédia do pecado original de Adão e
Eva é a tragédia de toda a humanidade. O pecado anuvia a mente, enfraquece e
escraviza a vontade e enche o coração de desgosto e desespero. Por isso é que
todo pecador, sente-se infeliz, miserável, sem saber exatamente porque. Pelo
seu sofrimento ele está pronto a culpar toda a humanidade e as condições de
vida. O primeiro mandamento faz o diagnóstico certo: a causa da infelicidade
das pessoas é a sua doença espiritual.
Nosso Senhor Jesus Cristo veio ao mundo para curar as
pessoas. Ele chama todos à Deus e à entrar em Seu Eterno Reino para a eterna
felicidade. O chamado de Cristo soa como a voz do Pai que ama, pedindo ao filho
perdido a voltar para casa. E quando um homem retorna a Deus, ele não carrega
uma bagagem de virtudes ou vem acumulado de talentos, ao invés disso, ele volta
como o filho pródigo que gastou os bens de seu pai.
A primeira bem-aventurança chama o homem para que ele
entenda sua doença espiritual e assim se dirija a Deus para pedir ajuda. Esse
primeiro passo é extremamente difícil. Não é fácil ao "filho pródigo"
a voltar aos seus sentidos, admitir sua falta e deficiência e voltar atrás. É
por isso que é prometida uma grande recompensa somente por este esforço da sua
vontade e cumprimento deste bom início: "Bem-aventurados os que são pobres
de espírito, porque deles é o Reino dos Céus." É extraordinário que da
mesma forma que aconteceu a queda do homem no pecado através do orgulho (serão
como deuses) a recuperação desse pecado começa com o humilde reconhecimento de
sua debilidade.
Pobreza espiritual não é a escassez financeira ou
inabilidade emocional. Pelo contrário, os pobres de espírito podem muito bem
ser ricos e talentosos. Pobreza espiritual é uma maneira humilde de conduzir o
pensamento, é o que resulta do reconhecimento da própria imperfeição.
Entretanto, humildade cristã não é desespero e tampouco pessimismo. Pelo
contrário, é uma intensa esperança na misericórdia de Deus e na real
possibilidade de tornar-se melhor. Ela está imbuída de alegre expectativa de
que, com a ajuda de Deus, nos tornaremos Seus filhos virtuosos que O agradam.
O reconhecimento da própria miséria (fraqueza) e o estado de
pecado daquele que crê se manifesta no estado de espírito penitente, se
assumindo pelas culpas passadas e a intenção de corrigir-se. Um arrependimento
sincero não raro acompanhado de lágrimas, é provido de poderosa graça. Ao
passar por isso a pessoa sente tanta leveza, como se um pesado fardo lhe fosse
tirado dos seus ombros. Esse sincero arrependimento nos direciona à segunda bem-aventurança:
"Bem aventurados os que choram, porque serão consolados."
Quando purificamos nossa consciência dos pecados, a harmonia
e ordem se aninham no nosso interior e preenchem nosso pensamento, nossos
sentidos e nossos desejos. Então uma sensação de apaziguamento e serena alegria
tomam o lugar da irritação e da ira. Uma pessoa em tal estado de espírito não
sente vontade de brigar com ninguém. Ela prefere perder uma pequena causa do
que perder a paz de espírito. Assim, o arrependimento leva o cristão ao
terceiro passo em direção à retidão - a humildade: "Bem-aventurados os
mansos porque eles herdarão a terra."
Certamente as pessoas maliciosas às vezes usam essa
humildade dos cristãos para seu próprio proveito, enganando, roubando ou
humilhando. Deus conforta os cristãos dizendo que na vida futura ganharão muito
mais do que perdem aqui. Se não for nesta vida, então na vida futura a justiça
triunfará e os mansos herdarão a terra, o que significa que herdarão todas as
bênçãos do mundo renovado onde habitará a verdade.
Por isso, as três primeiras bem-aventuranças que chamam o
povo a se voltar humildemente à Deus em estado de arrependimento e humildade
são o alicerce no qual a casa da virtude cristã deverá ser construída.
Da mesma forma que a volta do apetite num doente significa
que ele está se recuperando, o desejo para a retidão é o primeiro sinal de
recuperação do pecador. Enquanto ele vive em pecado o homem tem sede de
prosperidade, dinheiro, reconhecimento e prazeres corporais. Ele nem cogita
sobre enriquecimento da alma e até demonstra desprezo pela idéia. Mas quando
sua alma está livre da doença do pecado então o homem começa a desejar
ardentemente a perfeição espiritual. A quarta bem-aventurança fala sobre essa
aspiração à retidão: "Bem-aventurados os que tem fome e sede por justiça,
porque serão saciados."
O desejo para se tornar reto, ou justo, poderá ser comparado
com a próxima etapa da construção da casa da virtude - a construção das
paredes. Ao usar as palavras fome e sede, o Senhor nos mostra que o nosso
anseio à retidão não deverá ser inerte e passivo; pelo contrário, deverá ser
ativo e vigoroso. Afinal, um homem faminto não só pensa na comida mas também
faz tudo para saciar a fome. De acordo com o Sermão da Montanha, somente um
desejo ardente almejando a virtude fará um virtuoso a se saciar.
Subindo ao quarto degrau da virtude o homem já ganhou uma
certa experiência espiritual. Tendo recebido o perdão de Deus, tendo recebido a
paz de espírito e a alegria de ser adotado filho de Deus o cristão agora nesta
etapa já experimentou o Seu infinito amor. E o amor divino lhe aquece o coração
que responde com amor a Deus e compaixão ao semelhante. Em outras palavras, ele
se torna bondoso e compassivo e dessa forma sobe ao quinto degrau da virtude -
a misericórdia: "Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão
misericórdia."
A bem-aventurança da misericórdia é muito rica em
significados. A misericórdia deverá se expressar não somente em auxílio
material, mas também pelo perdão às ofensas, visita aos doentes, conforto aos
aflitos, bons conselhos, palavras de apoio, orações pelos seus semelhantes e
muitas outras ações. Literalmente todo dia temos oportunidades de ajudar o
próximo. A maior parte são pequenos e aparentemente insignificantes incidentes
que passam despercebidos. Mas a sabedoria espiritual de um cristão está na
capacidade de não desprezar pequenas boas ações pela grande causa da almejada
realização futura.
Os grandes planos muitas vezes não são realizados enquanto
que as pequenas boas ações em grandes quantidades se armazenam ao longo da vida
formando um significativo patrimônio espiritual.
Esse tipo de amor dinâmico purifica o coração do egoísmo e
traz o homem mais próximo a Deus, isso de forma tão forte que sua alma se
transfigura sob a influencia da luz espiritual. A pessoa começa a sentir no ar
a graça divina, e mesmo ainda na vida terrena já percebe Sua presença através
dos olhos de seu espírito. Assim, a alma humana se assemelha a um lago, que depois
de muitos anos de negligência ficou turvo e cheio de algas, mas quando limpo, a
luz do sol penetra em suas águas cristalinas. As pessoas que alcançaram tal
pureza da alma são o tema da sexta bem-aventurança: "Bem-aventurados os
puros de coração porque verão a Deus." Exemplos de tal pureza espiritual
que levam à clarividência podem ser encontrados nas vidas de santos como São
Serafim de Sarov, São João de Kronstadt, os Santos Pais de Optina e tantos
outros santos da Igreja Ortodoxa.
Deus faz destes homens o instrumento de Sua Providencia para
a salvação das pessoas e para este propósito abençoa-os com a sabedoria e alta
sensibilidade espiritual. No processo missionário de mostrar o caminho da
salvação esses santos homens se assemelham ao Filho de Deus, que veio ao nosso
mundo para reconciliar os pecadores com Deus. Essa pacificação espiritual é a
idéia central da sétima bem-aventurança: "Bem-aventurados os pacificadores
porque serão chamados filhos de Deus." É claro que todos devem procurar
ser pacificadores no seu meio familiar e com os amigos, mas a alta forma dessa
virtude requer um dom especial, que vem de Deus e que é dado a pessoas de
coração puro.
Ao procurar ser semelhante ao Filho de Deus, fazendo o bem,
o cristão também deve estar apto para imitar a Sua paciência. As duas últimas
bem-aventuranças falam do triste fato de que o mundo imerso no pecado não
suporta a retidão por muito tempo e se rebela contra os que a tem:
"Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino
dos céus. Bem-aventurados sois quando, por minha causa, vos insultarem e vos
perseguirem e, mentindo, disserem todo mal contra vós por causa de mim."
Da mesma forma que a luz faz dispersar a escuridão e mostra as coisas como elas
são, as vidas virtuosas dos verdadeiros cristãos evidenciam a crueldade moral
dos maus. Essa é a razão porque os pecadores odeiam os justos e querem se
vingar por sentirem remorso na sua consciência. Podemos ver esse ódio através
da História: a história de Caim e Abel e até a presente data, como por exemplo
nas perseguições aos cristãos nos países ateus.
As pessoas que tem uma fé fraca receiam demonstrar a sua fé
pois temem perseguição por sua convicção religiosa. Mas os verdadeiros justos e
mártires assumiram o sofrimento por Cristo com alegria porque seus corações
ardiam por amor a Deus. E até se sentiam felizes pela honra de poder sofrer
pela fé. Em dias de provação os cristãos devem tomar o exemplo daqueles justos
e consolar-se com as palavras de Cristo que prometeu: "Regozijai-vos e
exultai, porque é grande a vossa recompensa nos céus," pois quanto mais
forte é o amor maior será a recompensa.
Resumindo os comentários das últimas cinco bem-aventuranças
podemos verificar que todas elas apontam para o amor. A misericórdia que temos
ao nosso semelhante é a primeira forma desse amor. A pacificação espiritual é a
forma superior de amor que, para que seja bem sucedida requer pureza de coração
e iluminação que vem de Deus. Conservar a lealdade para Deus apesar de insultos
e perseguições e o desejo de oferecer a própria vida por amor a Cristo
representa a mais alta forma de amor a Deus. Portanto as últimas cinco
bem-aventuranças, que mostram ao cristão as mais perfeitas manifestações de
amor, desenham para ele o plano das arcadas superiores da catedral da virtude.
Ao concluir, é preciso prevenir o cristão que almeja o amor,
para que não esqueça os alicerces sobre os quais se assentará o edifício da
virtude: esses alicerces são a humildade, a pureza de consciência e a modéstia
(bem-aventurados os mansos). Pois, se os alicerces espirituais se enfraquecem e
racham o edifício ruirá. Nosso Senhor fala sobre esse perigo na última parte de
Seu Sermão. As partes seguintes que abordaremos, podem ser vistas como o
desenvolvimento dos princípios espirituais dados a nós através das
Bem-aventuranças.
Fonte: http://www.paideamor.com.br/
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