A doutrina das
indulgências está intimamente ligada à realidade do Purgatório, por isso vamos
mostrar o que a Igreja ensina sobre isto.
O Catecismo da Igreja (CIC) afirma que:
“Pelas indulgências,
os fiéis podem obter para si mesmos e também para as almas do Purgatório, a
remissão das penas temporais, sequelas dos pecados.” (§1498)O Papa Paulo VI
(1963-1978), logo após o Concílio Vaticano II confirmou mais uma vez a
realidade do Purgatório e das Indulgências na Constituição Apostólica Doutrina
das Indulgências (DI), e nela ensina com clareza toda a verdade sobre esta
matéria. Começa dizendo que:
“A doutrina e o uso
das indulgências vigentes na Igreja Católica há vários séculos encontram sólido
apoio na Revelação divina, a qual vindo dos Apóstolos “se desenvolve na Igreja
sob a assistência do Espírito Santo”, enquanto “a Igreja no decorrer dos
séculos, tende para a plenitude da verdade divina, até que se cumpram nela as
palavras de Deus (Dei Verbum, 8)”. ( DI, 1)
Assim, fica claro que
as Indulgências têm base sólida na doutrina católica (Revelação e Tradição) e,
como disse Paulo VI, “se desenvolve na Igreja sob a inspiração do Espírito
Santo”.
Como surgiram as Indulgências
O uso das
indulgências teve sua origem nos primórdios da Igreja. Desde os primeiros
tempos ela usou o seu poder de remir a pena temporal dos pecadores.
Sabemos que na Igreja
antiga dos primeiros séculos, a absolvição dos pecados só era dada aos
penitentes que se acusassem dos próprios pecados e se submetessem a uma pesada
penitência pública; por exemplo, jejum de quarenta dias até o pôr do sol,
trajando-se com sacos e usando o silício, autoflagelação, retirada para um
convento, vagar pelos campos vivendo de esmolas, etc., além de ser privado da
participação na Liturgia eucarística e da vida comunitária. Isto era devido ao
“horror” que se tinha ao pecado e ao escândalo.
Aquele que
blasfemasse o nome de Deus, da Virgem Maria, ou dos santos, ficava na porta da
igreja, sem poder entrar, sete domingos durante a missa paroquial, e, no último
domingo ficava no mesmo lugar sem capa e descalço; e nas sete sextas-feiras
precedentes jejuava a pão e água, sem poder neste período entrar na igreja.
Aquele que rogasse uma praga aos pais, devia jejuar quarenta dias a pão e água…
Essas pesadas
penitências, e outras, tinham o objetivo de extinguir no penitente os requícios
do pecado e as más inclinações que o pecado sempre deixa na alma do pecador,
fazendo-o voltar a praticá-lo.
Na fase das
perseguições dos primeiros séculos, quando era grande o número de mártires,
muitos cristãos ficavam presos e aguardando o dia da própria execução; eram os
Confessores da fé. Surgiu nesta época um belo costume: os penitentes recorriam
à intercessão dos que aguardavam presos a morte. Um deles escrevia uma carta ao
bispo pedindo a comutação da pesada penitência do pecador; eram as chamadas
“cartas de paz”. Com este documento entregue ao bispo, o penitente era
absolvida da pesada penitência pública que o confessor lhe impusera, e também
da dívida para com Deus; a pena temporal que a penitência satisfazia. Assim,
transferia-se para o pecador arrependido, o valor satisfatório dos sofrimentos
do mártir.
Desta forma começou o
uso da indulgência na Igreja.
Muitas vezes os
penitentes não tinham condições de saúde suficiente para cumprir essas
penitências tão pesadas; e isto fez com que a Igreja, com o passar do tempo, em
etapas sucessivas e graduais, fosse abrandando as penitências.
Na idade média, a
Igreja, com a certeza de que ela é a depositária dos méritos de Cristo, de
Nossa Senhora e dos Santos, o chamado “tesouro da Igreja”, começou a aplicar
isto aos seus filhos pecadores. Inspirados pelo Espírito Santo, os Papas e
Concílios, a partir do século IX, entenderam que podiam aplicar esses méritos
em favor dos penitentes que deviam cumprir penitencias rigorosas. Assim,
surgiram as “obras indulgenciadas”, que substituíam as pesadas penitencias. O
jejum rigoroso foi substituído por orações; a longa peregrinação, por pernoitar
em um santuário; as flagelações, por esmolas; etc.. A partir daí, a remissão da
pena temporal do pecado, obtida pela prática dessas “obras indulgenciadas”,
tomou o nome de “indulgência”.
Nos exemplos das
pesadas penitências públicas citadas acima, elas eram substituídas,
respectivamente, por uma indulgência de sete semanas e por uma indulgência de
40 dias; por isso as indulgências eram contadas em dias, semanas e meses, porque
assim, eram também contadas as penitências públicas.
Com a reza do Terço,
por exemplo, em qualquer dia do mês de outubro, se ganhava a indulgência de
sete anos.No século IX, os bispos já concediam indulgências gerais, isto é, a
todos os fiéis, sem a necessidade da mediação de um sacerdote. Assim, os bispos
estipularam que realizando certas obras determinadas, os fiéis poderiam obter,
pelos méritos de Cristo, a remissão das penas devidas aos pecados já
absolvidos.
É preciso compreender
que esta prática não se constituía em algo mecânico; não, o penitente, ao
cumprir a obra indulgenciada devia trazer consigo as mesmas disposições
interiores daquele que cumpria no passado as pesadas penitências, isto é,
profundo amor a Deus e repúdio radical de todo pecado. Sem isto, não se
ganharia a indulgência.Com o passar do tempo, e principalmente por causa da
“questão das indulgências” no tempo de Martinho Lutero, no século XVI, as
indulgências foram ofuscadas e tornaram-se objeto de críticas. No
entanto, após o Concílio Vaticano II (1962-65), o Papa Paulo VI reafirmou todo
o seu valor, na Constituição Apostólica Indulgentiarum Doctrina, onde quis
claramente mostrar o sentido profundo e teológico das indulgências; incitando
os católicos ao espírito de contrição e penitência que deve movê-los ao
realizar as obras indulgenciadas, removendo toda a aparência de mecanicismo
espiritual que no passado aconteceu.
O que são as Indulgências
As Normas sobre as
Indulgências, que acompanham a Constituição Apostólica A Doutrina das
Indulgências, ensina o que é a indulgência:
“Indulgência é a
remissão, diante de Deus, da pena temporal devida aos pecados já perdoados
quanto à culpa, que o fiel, devidamente disposto e em certas e determinadas condições,
alcança por meio da Igreja, a qual, como dispensadora da redenção, distribui e
aplica, com autoridade, o tesouro das satisfações de Cristo e dos Santos”.
(Norma 1)
É preciso entender
bem esta conceituação do que seja a indulgência. Em primeiro lugar, é
“remissão”, isto é, livra, liberta, da “pena temporal” devida aos pecados já
perdoados.
Todo pecado tem duas
consequências: o da culpa e o da pena, devido à desordem causada pela culpa.
Então, para que alguém fique totalmente redimido do pecado é preciso que
obtenha de Deus o perdão da culpa, mediante o sacramento da Reconciliação, e
restaure a ordem violada pelo pecado, cumpra a pena.Cientes disso, os primeiros
cristãos, até a idade média, infligiam a si mesmos severas penas (jejum de
muitos dias até o pôr do sol, flagelações, longas peregrinações, etc.) mesmo
após o perdão dos pecados, para cumprir a pena devida ao pecado.
O Papa Paulo VI assim
explica:”Assim nos ensina a revelação divina que os pecados acarretam como
consequência penas infligidas pela santidade e justiça divina, penas que devem
ser pagas ou neste mundo, mediante os sofrimentos, dificuldades e tristezas
desta vida e sobretudo mediante a morte, ou então no século futuro…” (DI, 2)
Paulo VI lembra
os ensinamentos de Santo Agostinho e de São Tomás de Aquino sobre o assunto.
Santo Agostinho
afirma que: “toda iniquidade, pequena ou grande, deve ser punida, ou pelo
próprio homem penitente, ou então por Deus (…)” (Com. Salmos LVIII 1,13; DI,
ref. 1).
São Tomás de Aquino também ensina que:
“Sendo o pecado um ato desordenado, é evidente que todo o que peca, age contra
alguma ordem. E é portanto decorrência da própria ordem que seja humilhado. E
essa humilhação é a pena” (S. Th. 1-2, q. 87, a.1; DI, ref. 3)
O Papa explica com clareza o efeito das penas temporais:
“Essas penas são
impostas pelo julgamento de Deus, julgamento a um tempo justo e misericordioso,
a fim de purificar as almas, defender a integridade da ordem moral e restituir
à glória de Deus a sua plena majestade. Todo pecado, efetivamente, acarreta uma
perturbação da ordem universal, por Deus estabelecida com indizível sabedoria e
caridade infinita, e uma destruição de bens imensos, quer se considere o
pecador como tal quer a comunidade humana.” (DI, 2)O Catecismo da Igreja ensina
o que é esta “pena temporal devida aos pecados já perdoados”:
“Para compreender
esta doutrina e esta prática da Igreja, é preciso admitir que o pecado tem
dupla consequência. O pecado grave priva-nos da comunhão com Deus e,
consequentemente, nos torna incapazes da vida eterna; esta privação se chama
pena eterna do pecado. Por outro lado, mesmo o pecado venial, acarreta um apego
prejudicial às criaturas que exige purificação, quer aqui na terra quer depois
da morte, no estado chamado purgatório. Esta purificação liberta da chamada
“pena temporal” do pecado. Essas duas penas não devem ser concebidas como uma
espécie de vingança infligida por Deus do exterior, mas antes como uma
consequência da própria natureza do pecado.” (§1472)
Portanto, fica claro
que o pecado, além da “pena eterna”, que é perdoada diante de Deus pelos
méritos da Paixão de Cristo, especialmente no Sacramento da Reconciliação,
acarreta também a “pena temporal”, que permanece mesmo após a remissão da pena
eterna. São as consequências que o pecado deixou na alma do pecador, a
desordem que promoveu no plano de Deus e a ofensa à Sua majestade.
É importante
relembrar aqui o que ensina a Igreja sobre o perdão dos pecados”A confissão
individual e integral seguida da absolvição continua sendo o único modo
ordinário pelo qual os fiéis se reconciliam com Deus e com a Igreja, salvo se
uma impossibilidade física ou moral dispensar desta confissão” (Ordo
Poenitentiae, 31; Cat. §1484)
Como a justiça de
Deus é perfeita, toda violação deve ser reparada, pois Ele é Pai, mas não é
paternalista. Deus não é conivente com o mal e nem “passa por cima das suas
consequências”, como se não as tivesse notado. Qualquer pai, mesmo perdoando ao
filho os seus erros, não deixa, no entanto, de corrigi-lo para que abandone o
erro e repare os seus estragos.
É preciso lembrar que
a expiação das faltas não quer dizer castigo de Deus, mas é exigida para apagar
as sequelas do pecado deixadas na alma do pecador. Isto liberta o pecador das
suas paixões e aumenta na sua alma o amor a Deus, que o faz rejeitar todo
pecado. Assim, são arrancadas as raízes do pecado que ainda permanecem após o
perdão das culpas.
O amor a Deus em nós,
nesta vida, ainda não é suficientemente forte para apagar todo o resquício de
pecado na alma. Essa concupiscência desordenada, que faz o homem voltar ao
pecado, por não ter ainda um amor tão grande a Deus, pode ser vencida nesta
vida ou no Purgatório.
O Concilio de Trento
(1545-1563) examinou cuidadosamente a doutrina das indulgências, por causa da
Reforma protestante. Na Sessão XXV, no Decretum de Indulgentiis, afirmou:
“Tendo recebido de
Cristo o poder de conferir indulgências, já nos tempos antiquíssimos usou a
Igreja desse poder, que divinamente lhe fora doado…”(DS, 1935; DI, ref. 1).
Na Sessão VI, cânon
30, afirmou:”Se alguém disser que a todo pecador penitente, que recebeu a graça
da justificação, é de tal modo perdoada a ofensa e desfeita e abolida a
obrigação à pena eterna, que não lhe fica obrigação alguma de pena temporal a
pagar, seja neste mundo ou no outro, purgatório, antes que lhe possam ser
abertas as portas para o reino dos céus – seja excomungado.”(DS 1580,1689,1693;
DI, ref. 8 )
O Concilio de
Trento, analisou cuidadosamente a doutrina das Indulgências porque
Martinho Lutero, em 1517, apresentou as suas 95 Teses divergindo da Igreja –
afixando-as nas portas da igreja de Wittenberg, na Alemanha - com base
principalmente na questão das indulgências. Esse Concilio, que foi o mais longo
da História da Igreja (1545-1563), em nada revogou a doutrina sobre as
indulgências, mas apenas disciplinou melhor a sua aplicação.
Falando das “penas temporais” dos pecados, afirmou:
“Uma conversão que
procede de uma ardente caridade pode chegar a uma total purificação do pecador,
não subsistindo mais nenhuma pena”. (DS 1712-1713; 1820)
O Catecismo da Igreja continua ensinando:
“O perdão do pecado e
a restauração da comunhão com Deus implicam a remissão das penas eternas do
pecado. Mas permanecem as penas temporais do pecado. O cristão deve
esforçar-se, suportando pacientemente os sofrimentos e as provas de todo tipo
e, chegada a hora de enfrentar serenamente a morte, aceitar como uma graça
essas penas temporais do pecado; deve aplicar-se, através de obras de
misericórdia e de caridade, como também pela oração e diversas práticas de
penitência, a despojar-se completamente do “homem velho” para revestir-se do
“homem novo” (Ef 4, 24)”. (§1472)
Algumas passagens da
Sagrada Escritura mostram as consequências dos pecados, mesmo após o perdão de
Deus. O Papa Paulo VI explica ainda que a realidade das indulgências
mostra o peso e a gravidade do pecado, e que por nossas próprias forças não
podemos nos livrar dos males que com eles afligimos a nós mesmos e à Igreja:
“Para brevemente
relembrar os principais benefícios, o uso salutar das indulgências ensina “como
é triste e amargo ter abandonado o Senhor Deus” (Jr 2,19). Pois, os fiéis,
quando se empenham em ganhar as indulgências, compreendem que por suas próprias
forças não podem expiar o prejuízo que se infligiram a si mesmos e a toda a
comunidade, e por isso são excitados a uma salutar humildade.”(DI, 9)
“Além disso, disse Paulo VI, o uso das indulgências ensina com que íntima
união em Cristo estamos ligados uns aos outros e que ajuda a vida sobrenatural
de cada um poder trazer aos outros, a fim de mais fácil e estreitamente se
unirem ao Pai.
Assim, o uso das
indulgências inflama eficazmente a caridade e de modo excelente a exerce quando
se leva um auxílio aos irmãos adormecidos em Cristo.”(idem)
O uso das indulgências dá-nos confiança e esperança na reconciliação
total com Deus, como ensina o Papa:
“A prática das
indulgências eleva igualmente à confiança e à esperança da total reconciliação
com Deus Pai; contanto, evidentemente, que ela se desenvolva sem dar margem a
nenhuma negligência nem diminuir a preocupação de se dispor devidamente a plena
comunhão com Deus. Com efeito, embora sejam as indulgências benefícios
gratuitos, não só concedidas tanto a favor dos vivos como dos defuntos a não
ser que se cumpram as condições requeridas para sua obtenção. Duma parte devem
ser cumpridas as boas obras prescritas, doutra parte deve o fiel apresentar as
disposições exigidas, isto é, que ame a Deus, deteste os pecados, tenha confiança
nos méritos de Cristo e firmemente creia na grande utilidade que para ele mesmo
representa a comunhão dos Santos.” (DI, 10)
Por outro lado, a
crença no valor das indulgências, faz-nos também, acreditar e nos submetermos
aos Pastores da Igreja, que receberam o “poder das chaves” de Jesus:
“Não se deve deixar
em silêncio que, adquirindo as indulgências, os fiéis docilmente se submetem
aos legítimos Pastores da Igreja, e particularmente ao sucessor de São Pedro,
que tem as chaves do céu, aos Pastores que o próprio Salvador mandou apascentar
e conduzir sua Igreja.” (DI,10)
Outra razão de ser
das indulgências, como mostra o Papa Paulo VI, é a de instaurar mais depressa o
Reino de Deus, e a de preparar a Esposa do Cordeiro para as Bodas (Ap 19,
7):
“A salutar
instituição das indulgências contribui, assim, por sua parte, para que a Igreja
se apresente a Cristo sem mancha nem ruga, mas santa e imaculada (Ef 5,27)
admiravelmente unida em Cristo pelo elo da caridade sobrenatural. De fato, por
meio das indulgências são os membros da Igreja padecente mais rapidamente
agregados à Igreja triunfante. Daí resulta que por essas mesmas indulgências o
Reino de Cristo se instaura muito mais rapidamente até que todos tenhamos
chegado à unidade da fé e de pleno conhecimento do Filho de Deus, à idade de
homem perfeito, à medida da estatura que convém ao complemento de Cristo (Ef
4,13)”. (DI, 9).
Paulo VI incentiva o
uso das indulgências, e explica que elas não diminuem a importância dos
outros meios que a Igreja nos põe à disposição para a busca da santidade e da
perfeição cristã:
“Assim, apoiando-se
nessas verdades, nossa santa Mãe igreja ainda uma vez recomendando aos fiéis o
uso das indulgências, que foi tão caro ao povo cristão por tantos séculos e o é
ainda, como o prova a experiência, não quer tirar nada às outras formas de
santificação, em primeiro lugar ao santíssimo sacrifício da missa e aos
sacramentos, sobretudo ao sacramento da Penitência, e em seguida aos abundantes
socorros agrupados sob o nome de sacramentais, assim como as obras de piedade,
de penitência e de caridade.
Todos esses meios têm
isto em comum: operar a santificação e a purificação com tanto maior eficácia
quanto mais estreitamente estiver o fiel pela caridade unido a Cristo-Cabeça e
à Igreja-Corpo. A preeminência da caridade na vida cristã é até confirmada
pelas indulgências. Pois não podem estas ser adquiridas sem uma sincera
metanóia e sem união com Deus, a que visa o cumprimento das obras. É portanto
mantida a ordem da caridade, esta ordem na qual se insere a remissão das penas
pela distribuição do tesouro da Igreja.
Enfim, exortando seus
fiéis a não abandonarem ou subestimarem as santas tradições de seus pais, mas a
religiosamente aceitá-las como um precioso tesouro da família cristã e a
segui-las, deixa a Igreja contudo cada um usar dos meios de purificação e de
santificação com a santa e justa liberdade dos filhos de Deus; doutra parte ela
sempre de novo vem lembrar-lhes o que deve ser colocado em primeiro lugar nos
meios ordenados à salvação, isto é, os que são necessários, os melhores e mais
eficazes.” (DI,11)
E, neste sentido, o
Papa relembra as palavras de São Tomás de Aquino: “…ainda que tais indulgências
muito valham para a remissão da pena, contudo outras obras de satisfação são
mais meritórias sob o ponto de vista do prêmio essencial; o que vem a ser
infinitamente melhor do que a remissão da pena temporal”. (S. Th. Suppl., q. 25,
ad 2; DI, ref. 47)
O mesmo Papa Paulo VI
ensina que a intenção da autoridade da Igreja ao conceder as indulgências, não
é apenas ajudar os cristãos a pagarem as penas que devem à justiça
divina, mas também, motivá-los a praticar obras de fé e piedade.
“A Igreja vai ao
encontro dos cristãos que, levados pelo espírito de penitência, buscam atingir
esta metanóia, com o fito de reencontrar, após o pecado, aquela santidade de
que foram inicialmente revestidos em Cristo pelo batismo. Distribui
indulgências, assim como a mãe, terna e cuidadosa, ampara os filhos fracos e
doentes. O que de forma alguma significa ser a indulgência um caminho mais
fácil, que nos permitisse evitar a indispensável reparação dos pecados. Bem ao
contrário. É uma ajuda que todo fiel, reconhecendo com humildade a própria
fraqueza, encontra no Corpo Místico de Cristo, o qual todo inteiro “concorre
para sua conversão pela caridade, pelo exemplo e pela prece” ( Lumen Gentium,
cap. 2, n. 11)”. (DI, ref. 39)
Outro ponto que a
conceituação de indulgência afirma, na (Norma 1), é que ela é “alcançada por
meio da Igreja”, que é a “dispensadora da redenção”. É ela, e somente ela, que
“distribui e aplica por sua autoridade o tesouro das satisfações de Cristo e da
Igreja”.
Portanto, só a
Igreja, que é o “Sacramento universal da salvação da humanidade” (LG, 48), por
vontade expressa do Pai e do Filho, pode conceder as indulgências. À Mãe
Igreja, receptáculo do “dom de Deus”, como disse Santo Ireneu (?202), distribui
aos seus filhos os méritos de Cristo e dos santos. Este é o “tesouro da
Igreja”.
Talvez possa parecer
a alguém que, através das indulgências, seja “fácil ou cômodo”se livrar das
penas dos pecados. Mas é preciso lembrar que a Igreja é Mãe amorosa, que quer o
bem dos seus filhos. Certa vez, o Cardeal Journet, falando das indulgências,
contou uma passagem da vida do Cura d’Ars, São João Vianney:
“Um grande pecador
tinha recebido do Santo Cura d’Ars a absolvição de seus pecados. Ele estava
disposto a fazer fosse o que fosse para reparar as culpas cometidas. Mas
impôs-se-lhe apenas uma penitência moderada, que ele considerou inadequada e o
deixou perplexo. O santo Cura deu-lhe então uma resposta muito simples,
mas profunda: ‘não temais, farei eu aquilo que falta’”. (Do livro Coração
Indulgentíssimo de Jesus, de Hugo Ferreira Pinto, Ed. Vozes, 1998, Petrópolis,
p. 45)
É exatamente isso que
a Mãe Igreja faz pelo seu filho pecador penitente, deveras
arrependido e desejoso de reparar as suas faltas por amor a Deus; Ela, com os
méritos de Cristo ‘faz aquilo que falta’ para a salvação do filho. Isto explica
as indulgências. Antes de subir para o céu, Jesus disse aos Apóstolos: “Toda
autoridade me foi dada no céu e na terra” (Mt 28,18), e esta autoridade Ele a
conferiu à Sua Igreja. Jesus deu autoridade aos apóstolos para ensinar e agir
em Seu próprio nome:
“Quem vos ouve a Mim
ouve, quem vos rejeita a Mim rejeita; e quem Me rejeita, rejeita Aquele que Me
enviou”. (Lc 10,16)
“Da mesma forma, no que acresce ‘que os escolásticos inchados com suas sutilezas introduziram um mal compreendido tesouro dos méritos de Cristo e dos Santos, e à clara noção da absolvição da pena canônica substituíram a confusa e falsa da aplicação dos méritos’, como se os tesouros da Igreja, donde o papa dá as indulgências, não fossem os méritos de Cristo e dos Santos: – é falsa, temerária, injuriosa aos méritos de Cristo e dos Santos, já há muito condenada no art. 17 de Lutero (Prop. 41)”. (idem) “Da mesma forma, no que acresce: ‘mais triste ainda é que esta quimérica aplicação se pretendeu aplicar aos defuntos’ : – é falsa, temerária, ofende aos ouvidos pios, injuria aos Romanos Pontífices, e à praxe e ao sentir da Igreja universal, induz ao erro de sabor herético de Pedro de Osma, outra vez condenado no art. 22 de Lutero (Prop. 42)”.(ibidem)
Paulo VI reconhece que às vezes houve abusos no uso das indulgências, mas isto não anula o seu valor e a sua necessidade para os fiéis e para a Igreja” Aconteceu às vezes, é verdade, introduzirem-se abusos no uso das indulgências, quer “por concessões injustificadas e supérfluas ” tivesse sido aviltado o poder das chaves que a Igreja possui e enfraquecida a satisfação penitencial (IV Concilio de Latrão -1215), quer como consequência de “proveitos ilícitos” fosse desonrado o próprio nome das indulgências”. Mas, retificando e corrigindo os abusos, a Igreja “ensina e ordena que o uso das indulgências, particularmente salutar ao povo cristão e aprovado pela autoridade dos santos concilios, seja conservado na Igreja, e fere com o anátema aos que afirmam serem inúteis as indulgências e negam à Igreja o poder de as conceder” (Decreto sobre as Indulgências, Concilio de Trento)”.(DI, 8)
E o Papa Paulo VI, sem receios, assim como fizeram os demais Papas, incita o povo cristão ao uso bom e correto das indulgências:
“Ainda hoje convida a Igreja todos os seus filhos a considerarem e a meditarem na vantagem que pode oferecer o uso das indulgências, para favorecer a vida de cada um deles bem como a de toda a comunidade cristã.”(DI, 9)
Do livro: O Purgatório – O que a Igreja ensina, Prof. Felipe Aquino
Via: Cléofas